Takarazuka Kagekidan significa literalmente “Companhia Teatral Takarazuka”, mas também é conhecida como Teatro ou Ópera Takarazuka. Trata-se de um estilo teatral único, desenvolvido no Japão ao longo do século XX, que se tornou bastante popular no arquipélago e está se tornando cada vez mais conhecido no exterior devido à influência que exerceu no mangá (quadrinhos japoneses).
A Ópera Takarazuka foi fundada em 1914 por Ichizo Kobayashi, empresário que apreciava estilos teatrais musicais ocidentais. Presidente da Empresa Ferroviária Hankyu, ele teve a idéia de construir um teatro e fundar uma trupe para incrementar o turismo na cidade de Takarazuka, que já era conhecida por suas termas desde a Era Meiji (1867-1912) e que também era o ponto final de uma das linhas ferroviárias de sua empresa. Mas só a partir de 1927, com a construção do Takarazuka Dai Gekijou (Grande Teatro Takarazuka), a trupe passou a realizar performances regulares. Nos anos 30, a trupe Takarazuka já era altamente profissionalizada, e qualidade de suas produções concorria em igualdade com as mais famosas companhias de teatro de revista musicais da Europa e dos Estados Unidos.
Kobayashi inovou o teatro no Japão sendo ao mesmo tempo extremamente conservador, criando uma trupe exclusivamente feminina. Durante séculos, a atividade teatral no Japão foi um feudo masculino. A proibição da presença de mulheres nos palcos japoneses devia-se a um decreto de 1629 de Iemitsu, o 3º xógun Tokugawa, em função de escândalos relacionados ao então nascente estilo teatral Kabuki. Confere-se a uma dançarina chamada Taisha Izumo, que usava o apelido artístico de Õkuni, o título de criadora do Kabuki ao reunir em 1603 um grupo de dançarinas e cantores para uma performance às margens do rio Kamo em Kyoto. O Kabuki se baseava em danças folclóricas que eram consideradas sensuais praticadas apenas por mulheres. Apresentações de Kabuki passaram a ser realizadas na capital do xogunato, Edo (atual Tóquio) em 1607 e logo tornaram-se populares. Mas como muitas das dançarinas de Kabuki também eram prostitutas, uma série de escândalos envolvendo as atrizes e samurais na capital gerou protestos, e em resposta à indignação popular o xógun, além de banir as mulheres do palco, obrigou oKabuki a seguir formas de organização similares às do então já tradicional teatro Nô, encenado exclusivamente por homens.
Desde então passou-se a considerar o palco uma “atividade indigna” para mulheres no Japão, e essa ainda era a mentalidade vigente quando Kobayashi fundou seu grupo teatral no início do século XX. Apesar de inspirar-se em estilos musicais ocidentais, como os dos musicais e teatros de revista da Broadway e de Paris, Kobayashi não queria que suas atrizes fossem vistas como meras cantoras de cabaré. Ele queria criar uma forma teatral feminina pela qual o público japonês tivesse respeito e cujas performances pudessem ser vistas por uma platéia familiar, que era o perfil do público que já freqüentava o onsen (termas) de Takarazuka. Assim, Kobayashi fundou primeiro uma academia, a Escola Musical de Takarazuka, que desde então vem selecionando e preparando atrizes para a trupe. O hino da escola, Oo Takarazuka, apresentado em performances até hoje, faz referência à época em que as alunas usavam um hakama (saia-calça larga, usada por homens e mulheres com um quimono) azul-esverdeado como uniforme, pelo qual identificava-se que as jovens eram estudantes de Takarazuka.
Sob o lema “kiyoku, tadashiku, utsukushiku” (pureza, correção e beleza), o Takarazuka seleciona e treina jovens aspirantes a atrizes, que durante dois anos deverão dedicar-se em período integral a aulas de dança, canto, interpretação, e até a ajudar na limpeza e manutenção do teatro antes de pisar no palco. O caminho para o estrelato também é longo: as atrizes fazem uma verdadeira carreira, galgando aos poucos degraus que vão desde a categoriashinjin (atriz novata) à top star, especializando-se emmusumeyaku (caracterização feminina) ou otokoyaku(caracterização masculina). Em média, 10 anos são necessários para se tornar uma top do Takarazuka, e assim como no teatroKabuki os atores mais prestigiados são os que interpretam papéis femininos, no Takarazuka as atrizes mais famosas são as que interpretam os papéis masculinos.
(trecho do livro JAPOP – O poder da cultura pop japonesa, de Cristiane A. Sato)
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